sexta-feira, 9 de abril de 2010

Um cachorro chamado diploma

Seu Josias ou Coronel Josias, reza a lenda que do alpendre da Casa Grande, de frente à praça,em Simões, no Piauí,  estrategicamente, aquele cidadão de estatura baixa, fala mansa, marcou história nos anais da política local, construindo um legado, que em muito se distanciava dos modelos coronelistas de então. Sensível ao cumpadrio, promovia uma alteridade no exercício do poder; para a prole, um visionário, educação era o norte.
E nesse rumo, gostava de sentar na calçada e acompanhar a  partida dos filhos para Petrolina, Salvador, imersos na boléia dos Pau de Arara, andando léguas e léguas em estradas viscinais, inóspitas, onde tinha-se tempo para escrever um livro numa olivetti, pegar uma gripe e chegar curado.
E lá iam Avani, Joaquim, Abércio e Pedro de Josias. Os 3 primeiros bem encaminhados. Pedro, o primeiro na idade, e derradeiro nos estudos, não tinha a menor vontade de sair do mato. Portanto, iria, mas o levaria em seus rastros.
Chegando na Terra de Seu Quelé (Coronel Clementino Coelho, Pai dos Osvaldo, Paulo, Nilo e avô de FBC), coube a Avani encontrar uma escola que absorvesse a demanda de um aluno de 17 anos para alfabetizá-lo, isso em 1950, pasmem. No entanto, lá ia Pedro.
No primeiro dia, seguindo a trilha da roça pra escola, um assovio fifiuuuuuuuuuuu.
 De bate pronto, Pedro respondeu: "mato um".
 Avani tentando apaziguar, foi logo avisando: "é um viado Pedro, deixa pra lá".
No que ele retrucou."No dia que num conhecer um viado do mato, era um pederasta mesmo, atiro na boca dele e enfio a espingarda no rabo".
Pro primeiro dia, deu pro gasto. Na escola, a professora disse: " vamos estudar adjetivo".
Eis que Pedro questionou: "o que é adjetivo ? Vem de onde ? E porque qualidade se nem conheço ? e quem viu ou prova ?  E essa foi a tônica, de um semestre digno da melhor análise paulofreiriana.
O resultado final, apontou para o encerramento de um ciclo.A professora tratou de chamar os irmãos e disse: "tem condição não".
Na saída da escola, buscando-se o resgate da auto-estima. "Pedro vamos tomar sorvete". Lá chegando, o bicho fumaçando, não conhecia gelo, trincou nos dentes, cuspindo-o longe.
 Ganhava o diploma. A volta pra casa foi adiantada e graduado em seis meses, semelhante aos profissionais de pós-graduação dos idos atuais. O homem tava na frente dos tempos.
 No dia do retorno, apaixonou-se por um cachorro vira lata, pé duro, jogou em cima do caminhão e trouxe a reboque , descendo a serra com o bicho no colo, depois de ter cagado e urinado o trajeto todinho.
Seu Josias, todo prosa,  cerimonioso, não se fez de rogado:
" Pedro, sabia que não ia me decepcionar; os outros meninos, gastam mais e demoram 4 anos pra se formar. Pedro demorou pra ir, porém em 6 meses, volta formado e ainda trás um diploma ".
Depois dos agraciamentos paternos, o diploma teve vida curta e não chegou a ser registrado, morto pela condição de arquivo.